terça-feira, 20 de agosto de 2013

Há três anos no Egito, frade fala sobre situação no país

Da Redação

Arquivo Canção Nova
Frei Patrício Sciadini atualmente é o responsável pela comunidade carmelita no Egito

O carmelita frei Patrício Sciadini, que mora há três anos e meio no Egito, falou sobre a "dolorosa" situação, decorrente dos conflitos políticos, que atinge o país e a realidade dos cristãos no local.

Em entrevista à Canção Nova, nesta segunda-feira, 19, o frade destacou o clima de apreensão que aflige os moradores, e ressalta que os cristãos, mesmo sendo minoria, são chamados a ser testemunhas de Jesus.

Após viver 40 anos no Brasil, atualmente o frade reside em um mosteiro de sua ordem, no bairro Shubra, no Cairo, onde é responsável pela comunidade carmelitana no país.

Leia a entrevista na íntegra:


noticias.cancaonova.com: Qual a missão do senhor no Egito?

Frei Patrício: Eu estou aqui no Egito na igreja de Santa Tereza, num dos bairros mais pobres do Egito, mais populoso, somente aqui, temos seis milhões de habitantes e temos uma grande Basílica dedicada a Santa Terezinha que é muito estimada e amada pelos cristãos, pelos coptos, pelos ortodoxos e estimada também pelos muçulmanos. Estou aqui como responsável pela comunidade carmelitana aqui no Egito. Depois de ter vivido 40 anos no Brasil. 
noticias.cancaonova.com: Há quanto tempo o senhor está no Egito?

Frei Patrício: Estou há três anos e meio aqui e ainda meu árabe é só pra não para não morrer de fome, não morrer de sede e se me perco, voltar pra casa, somente. Porque a língua é um pouco difícil.

noticias.cancaonova.com: Qual a realidade dos cristãos diante dos conflitos ocorridos no Egito, em especial nesses últimos meses?

Frei Patrício: A realidade dos cristãos é muito complexa aqui, somos muito poucos. O país tem 85,80 milhões de habitantes e os cristãos somente 10%. Mas os cristãos em plena comunhão com Roma, os copta-católicos, são muito menos uns 250 mil e os de rito latino, ainda menos 7 mil, 10 mil pessoas. E a situação é uma situação de minoria, quando somos minoria sempre sofremos realidade ou opressões por parte da maioria. E nesse momento no Egito, a situação política, a situação entre os irmãos muçulmanos e entre o Exército é uma situação muito dolorosa, porque tem morrido muita gente e ainda não vemos uma solução.

A nossa Igreja está fechada como tantas igrejas e segundo as notícias mais de 50 igrejas foram atacadas nesses dias. Então, se vive esse clima de apreensão, de dificuldade, mas, nós sabemos que para nós cristãos, que temos fé, a cruz é sempre um motivo de alegria e somos chamados a dar testemunho de Jesus. Não um testemunho através da palavra, porque é muito limitada, mas um testemunho através das obras, através da nossa vida particular. Então é uma situação como você pode ver pelos meios de comunicação internacionais, bastante preocupante. O Santo Padre, por 3 ou 4 vezes tem rezado pelo Egito, e vivemos um momento de apreensão, mas temos esperança que isso passará.

noticias.cancaonova.com: Como os cristãos estão se posicionando diante dessa constante guerra?

Frei Patrício: Os ortodoxos, os cristãos em geral se posicionaram ao lado do Exército, então se posicionaram para que volte a paz volte a harmonia, isso foi falado claramente, mas é claro que também os cristãos não concordam com tantas mortes, com tanta violência que tem por aí.
noticias.cancaonova.com: E a nossa Igreja católica, como tem se posicionando, a Igreja local no caso?



Frei Patrício: A Igreja local não tem falado, porque aqui somos uma minoria, muito pequenina. Não temos tomado uma decisão pública, mas nós vivemos esse momento em comunhão também com a Igreja de todos os cristãos. Somente um bispo tem falado que os católicos não são responsáveis de tudo aquilo que tem acontecido. É uma situação, por isso, muitas pessoas considerem os cristãos como responsáveis, mas na verdade é um momento de sofrimento de purificação que devemos saber olhar com muita esperança e que Deus sem dúvida não deixa e nunca abandona aqueles que o amam e procuram. Eu sei que todo mundo reza e também a Canção Nova reza, e queria aproveitar para mandar meu abraço a todos amigos da Canção Nova, principalmente ao meu grande amigo, monsenhor Jonas Abib.


noticias.cancaonova.com: A mídia também tem divulgado algumas notícias de que muitos cristãos e muçulmanos estão unidos para protegerem-se mutuamente contra esses atos de violência. O senhor tem alguma notícia a respeito disso?


Frei Patrício: Não. Não há esta unidade. Todos os cristãos e muçulmanos de boa vontade estão unidos para que volte a paz. Então aquilo que a Igreja tem pedido e que também o poder tem prometido é que deve existir respeito para todos os egípcios, porque antes de serem cristãos também são egípcios, então para haver respeito para a Igreja precisa que as igrejas tenham possibilidade de manifestar a própria fé com liberdade e não sob pressão, ou com este medo. Todas as igrejas são vigiadas pela polícia nesse momento, para que não aconteça nada de grave.


noticias.cancaonova.com: Frei Patrício, qual sua análise sobre a primavera árabe?


Frei Patrício: A primavera penso que já é inverno. Foi um momento de busca de liberdade e houve essas realidades mas sem dúvida é essa insatisfação generalizada. A insatisfação é boa, é necessária, porque mediante a insatisfação buscamos caminhos novos e melhores. Ora, o que o Papa falou neste domingo que "fé e violência são inconciliáveis" precisa ser compreendido. Em nome de Deus, não se pode fazer guerra, como dizia o beato João Paulo II. E eu diria também que, no nome do homem, não se pode fazer guerra.


Eu escrevi um artigo hoje "o que podemos aprender na escola da guerra", podemos aprender o diálogo, aprender a escuta, o respeito... Nós devemos ser pessoas animadas não pelo otimismo, mas pela fé. É ela que nos anima neste caminho e nesta busca. Então, uma primavera passou e agora é preciso esperar uma outra primavera, depois outro inverno, outra primavera... Mas precisamos também do verão, porque primavera dá flores, mas não dá fruto. Precisamos de frutos. E frutos da paz, da justiça e do amor.

noticias.cancaonova.com: No seu ponto de vista, qual o melhor caminho para o fim dos conflitos?



Frei Patrício: O melhor caminho é parar, refletir, pensar que a vida de uma pessoa vale tanto quanto a vida de outra pessoa. Não tem pessoa mais importante ou menos importante. E quando se dá morte, é o fim da vida. Quando a pessoa está no cárcere, na prisão, ainda tem vida e pode sair. Do cemitério nunca vi sair ninguém. Então nós devemos compreender esse grande respeito para a vida. E ao redor da vida e dos valores fundamentais: da paz, da justiça, do trabalho, podemos sempre nos encontrar para refletir e procurar um caminho. 


É um momento de sofrimento, mas o sofrimento nunca é um beco sem saída. É sempre uma saída quando no coração do homem entra a paz, porque todas as guerras, pequenas ou grandes, nascem dentro do coração da pessoa que não se abre à paz, ao amor e à luz de Deus. 


noticias.cancaonova.com: Há algo que possa ser feito, em âmbito mundial, para contribuir com a paz no Egito?

Frei Patrício: Sim. Todos os países do mundo estão preocupados e tentam dar conselhos, mas são problemas muito internos, então o que é necessário é que aqui dentro do país se encontre esse caminho. Mas todos os conselhos são bem vindos. Eu creio que há uma abertura para tudo isso, principalmente para nós que temos fé, aquilo que é mais forte neste momento é a oração para que Deus, que é autor da luz, da paz e do amor, não abandone esse povo tão amado e esse povo que busca o melhor para o seu futuro.

Fonte: Canção Nova

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